Um navio porta-contêiner ganhou a atenção de todo o mundo quando encalhou no Canal de Suez, no Egito, no dia 23 de março. Por seis dias, o Ever Given, como é batizado, provocou a paralisação da hidrovia e trouxe dificuldades de abastecimento, já que a rota lida com aproximadamente 12% do volume do comércio global. Duas semanas depois e o navio e sua carga seguem ancorados no lago do Canal de Suez, pois está proibido de deixar o local até que pague uma multa bilionária (sim, US$ 1 Bilhão), para compensar os estragos causados pela paralisação.
Não é incomum que navios de carga tenham problemas que atrasem a sua chegada ou que impactem sua carga. Em janeiro deste ano, por exemplo, o clima e o mar agitado foram os responsáveis pela perda de 750 contêineres de um navio operado pela A.P. Moeller-Maersk S/A. Desta vez, no entanto, a situação foi diferente: toda a carga do Ever Given permaneceu intacta, mas o navio encalhou em um trecho muito estreito do canal e impediu que qualquer outro pudesse trafegar por esta rota comercial vital.
Os efeitos deste acidente não são tão drásticos para o Brasil, pois a principal rota utilizada por nós para a importação de mercadorias é a que liga o país à Ásia. Porém, em função da alta demanda de importações, muitas empresas vinham utilizando também a rota europeia para trazer os produtos para cá (as embarcações fazem o transbordo na Europa antes de seguir viagem). Sem essa alternativa, a capacidade diminui, aumentando o custo dos fretes. Agora, já imaginou se esse problema acontecesse no Canal do Panamá?
Visão completa de causa e efeito para definir a melhor estratégia
Seja um navio encalhado, o extravio de contêineres ou mercadorias, toda empresa que dependa de importação, ou que venda para o mercado externo e precise enviar seus produtos para outros países, deve trabalhar com cenários, prever crises, ter visibilidade de toda a cadeia para ter mais tranquilidade para lidar com adversidades como essas. E minha sugestão é que elas se apoiem em bons softwares de gestão, inovação e cloud (com todas as informações e detalhes na nuvem, os diversos stakeholders impactados pelo incidente podem acessar os dados para a melhor tomada de decisão).
A tecnologia vai permitir aos envolvidos ter mais visibilidade, agilidade para tomar decisões, simular e gerar cenários, coordenar e orquestrar as informações para que o impacto diminua. Por exemplo: se eu sou um produtor de frutas e utilizo contêineres refrigerados para exportar a minha produção para outros países, como lido com a escassez de contêineres e com o consequente aumento do preço do aluguel deles? Ao saber sobre o navio encalhado, eu posso rapidamente analisar todas as possibilidades e decidir negociar com mercados locais a compra daquela mercadoria que, por ser perecível, seria perdida dentro de poucos dias pela ausência de transporte adequado.
Eu também poderia ser gestor de uma grande indústria, que dependa de matéria-prima vinda de outro país. Com a informação do acidente, a análise e a simulação de cenários posso decidir colocar outras peças em produção, alocar minha equipe em outras funções ou mesmo fazer uma compra de outro lote menor de suprimentos que chegue mais rápido, em avião cargueiro, por exemplo, para suprir uma demanda imediata até que o navio consiga sair e chegar ao seu destino. Com o suporte de inteligência artificial e um número grande de eventos para ensinar o software, posso “prever” a data de chegada mais provável com mais precisão e, assim, partir para a ação de esperar ou expedir novas entregas.
Por isso, tenha preparados os envelopes com os cenários para atingir seus objetivos, como a tripulação do bombardeiro B-52 na obra-prima de Stanley Kubrick, Dr. Fantástico. A estratégia ideal foi simulada e concebida, mas percalços e a realidade obrigam os comandantes na linha de frente a traçar novos cenários a partir dos dados da situação para ter uma visão completa de causa e efeito. Inteligência artificial e big data em consonância com softwares para a gestão de estoques (para lhe dar visibilidade da cadeia ou lhe oferecer dados preditivos) serão valiosos neste momento para tomar a decisão de (1) esperar que o canal se abra ou (2) contornar o Cabo da Boa Esperança.
Por Antonio Carlos Brito, Sr. Principal, Digital & Value Engineering LATAM na Infor
*Imagem: Sabine Fischer por Pixabay